domingo, 14 de fevereiro de 2010

"Arranque o Lula da Parede!"


Recentemente, participei da mais atual etapa do projeto Biotupé, realizada na região amazonense, na RDS do Tupé. A parceria é entre o INPA e a Puc-Campinas, além de renomados pesquisadores, que ofereceram a oportunidade de jovens universitários se envolverem com políticas públicas daquelas comunidades.
Na Reserva de Desenvolvimento Sustentável, os estudantes tinham a meta de pesquisar variáveis sociais em residências do local, através de formulários, a partir dos quais, pretende-se criar o Índice de Qualidade Socio-Ambiental (IQSA), que considera aspectos como condições de renda, saúde e habitabilidade. Como futura jornalista, tive a missão de acompanhar meus colegas nas visitas residências, com o objetivo de relatar aquela realidade, por meio de um documentário. Uma grande experiência profissional. Um enorme enriquecimento pessoal.

Na primeira casa que visitamos, fomos recebidos pela Dona Maria, a típica dona de casa, que cuida dos filhos, da limpeza dos poucos cômodos, da organização dos escassos móveis. Maria que não diz nada sem João, não encara-nos de cabeça erguida, sussurra ao invés de falar, e amamenta, o filho que chora. Em sua simplicidade, nos ensina a sorrir em meio a precaridade, e esperar sem desespero, o futuro melhor, que um dia chegará. Ou não.

Próximo dali, ainda na comunidade Tatulândia, encontramos a Dona Rosa. Nada tinha de Maria do João, embora se ocupasse com afazeres domésticos. Encarou-nos nos olhos. Impôs um tom de voz respeitável, e ao ver a câmera, disparou críticas e reclamações sobre as condições de vida da comunidade. Olhava fixa à lente, feliz por poder falar o que estava engasgado. Implorar soluções para suas dificuldades. A alegria de ter voz ativa. Falar e ser ouvida.

Dona Rosa não conhecia o Projeto Biotupé, e caso já tivesse ouvido falar, não associava o nome. Para ela pouco importava o que nós tínhamos para lhe oferecer. Era visível a descrença daquela senhora. O cansaço de tantas promessas, que não evoluem desse estágio.
A senhora arretada nos revelou as precaridades da comunidade. As visíveis já haviam despertado minha atenção, a começar pela condição da habitação. Porém, só quem vive ali, conhece as feridas que mais incomodam sobre a pele.

Contou-me o problema da falta de escola e de posto de saúde. Surpreendeu-me pela visão consciente: “Se a pessoa não lutar, se a pessoa não persistir, vai acontecer alguma coisa? Não vai, mais não vai mesmo. São coisas que também dependem dos comunitários, dos moradores, de todos. Não só de uma pessoa. Você acha que uma andorinha só faz verão? Não faz, não, Se não houver união entre os comunitários, isso aqui nunca vai pra frente. Nunca.”

Apresentado os problemas, Dona Rosa, emendou críticas, num tom de indignação e exigência. O foco das reclamações foi o Programa do Governo Federal “Luz para Todos”, que surge como forte propaganda governamental. Porém analisando de perto, considerando os “beneficiados”, é visível a publicidade “meramente ilustrativa”.

A promessa do Governo Lula era levar luz “pra todos” das comunidades da RDS, até o mês de dezembro de 2009. No dia 29 de janeiro de 2010, Dona Rosa, mostrava-se decepcionada e com a esperança no tanque de reserva. Nada de luz. Tudo são promessas.

Acatei a crítica de Rosa, apoiei em suas palavras, conversamos sobre o Governo, a política de nosso País. Revelei à ela, as mazelas do Estado de São Paulo, não para confortá-la, mas para me aliviar, desabafar. Dona Rosa expressava-se de forma áspera e isso representou-me a ânsia por um país melhor, e fez-me acreditar que existem pessoas dispostas a lutar para isso.

Confesso que fiquei contente com a ação daquela mulher, a coragem de gritar e demonstrar sua insatisfação. Ah, se todos fosse como Dona Rosa... A passividade passa longe dali. A briga por uma vida melhor está em cada expressão da face daquela idosa, que outrora fora funcionária da Aeronáutica.

A conversa fascinou-me pela motivação daquela senhora, o inconformismo que faz com que as coisas melhorem, ou que pelo menos pressiona para isso. Um fascínio iludido, confesso-lhes. Dona Rosa, criticava a falta de energia elétrica, mas a ignorância, não sendo isso um insulto a nobre mulher, fez com que Dona Rosa falasse uma coisa e se contrariasse em imagens.
O Projeto de Lula não a beneficiou, tampouco a tantos outros ribeirinhos. Estava claro que o presidente era mais um daqueles que prometem, e nem sempre cumprem. No entanto, por ironia ou desinformação, entre os poucos adereços que enfeitavam a casinha de Dona Rosa, estava um poster. Nesse retrato, o presidente Lula sorria-nos, num sorriso ambíguo, metafórico e ilusório.

A conversa perdeu o rumo, assumo-lhes. Fitava o presidente e ele retribuía com olhar cínico. Aquele que implora por votos nas eleições. Voltada novamente à Dona Rosa, só podia perguntar: “Rosa, a senhora de fato está insatisfeita com os projetos governamentais?”. Com uma certeza peculiar, afirmou-me que sim. “Então Dona Rosa, arranque o Lula da Parede!”

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