quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Basta apenas um olhar...


Tia, compra uma balinha?
Tia, dá uma moedinha?
Moça, tem um trocadinho?
Moça, me dá dinheiro?

Muitas vezes, basta estender as mãos, ou passar uma flanelhinha no vidro dianteiro. As palavras são desnecessárias. A pobreza é perceptível nas vestimentas, nos detalhes sofredores do rosto, as mãos eos pés são indicadores da marginalidade. O local é propício: semáfaros. Pedintes e vendedores de docinhos mesclam-se nos cruzamentos. Regida pelo preconceito, a população inserida na sociedade, discremina e teme os marginalizados. O grande mal é a generalização. Se político é corrupto, mendigo é drogado ou bandido. Grande equívoco, afinal quem pode julgar seu próximo?

Não vou me aprofundar neste mérito, embora seja pertinte a discussão.
A questão importante é a surpresa, o contrasenso.
Enquanto engravatados envergonham nossas Instituições, um senhor de chinelo, camiseta rasgada, bermuda bem usada, boné distribuido em campanhas eleitorias aproxima-se do meu carro. Torço para o sinal abrir, e ação de fechar os vidros é quase que automática. Numa sociedade capitalista, somos orientados pelo medo, insegurança e pré-julgamento.
O semáfaro não abriu, e o vidro não subiu na agilidade que esperava. Tive sorte.

Ao meu lado estava minha mãe. O senhor foi chagando e a ansiedade temorosa também. "Tem um trocado?" Simplesmente neguei com a cabeça. "Tudo bem, obrigado". Mais que a educação e compreensão, o senhor sem gravata tinha sensibilidade. Mesmo sem usar terno, tinha caráter e uma carência de conversa.
Os olhos verdes de minha mãe, fizeram o pedinte lembrar-se da mãe dele. Nos contou, que ela chamava-se Maria, e com a lembrança veio um sorriso, demonstrando a saudade, daquela que provavalmente o criou.

O sinal abriu, mas o olhar, também esverdeado continuou em minha lembrança. Como eram os olhos de Maria? Apesar de todas as dificuldades, o senhor não esquecia de sua mãezinha, e não restringia seu sorriso.

Muitos já foram assaltados em cruzamentos. Mas, num dia de sorte, uma abordagem nos vidros laterias pode render-lhe um sorriso.

Pode parecer demagogia, porém as grandes conquistas estão nos pequenos detalhes. As alegrias mais sinceras não são fruto da riqueza, mas sim dos sentimentos que vem do coração. A saudade é um destes, pois reflete um grande amor.

2 comentários:

  1. "Basta apenas um olhar"... Sensibilidade à flor da pele. Um breve artigo que diz muito para quem sabe ler nas entrelinhas. Quero ver você no Estadão, na CBN, ou onde a sabedoria do Universo a colocar. Vai ser um imenso prazer dizer: eu vi essa menina começar a sua carreira quando ela tinha apenas 18 anos! E já era fã dela "naquele tempo"...

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  2. Eu adoro ler essas coisas. Tais palavras deixam-me sem resposta, ainda mais vindas de uma pessoa como você, Vera, que tem visão crítica, pontos de vistas interessantes,luta por seus ideias e grande referência nas discussãoes #VPolit... Admiro sua postura.. o Prazer é meu receber tamanho elogio =)
    Vou me esforçar mto para estar um dia no Estadão, ne CBN... E vou dizer.. essa mulher acreditou em mim e me incentivou "naquele tempo"
    Obrigada =)

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